Trajetória do Artista

Origens

Sou de Silvânia (Goiás-Brasil), lugar de cultura caipira, emotiva e hospitaleira. Nasci em 1955 e, junto com a minha família, fomos viver a aventura pioneira da construção de Brasília, em 1957. Foi uma experiência incrível fazer parte deste momento único da criação de uma nova capital, no centro do país. Me lembro da primeira missa no cerrado e da grande festa de inauguração, na praça dos Três Poderes. Aviões desenhando sonhos no céu maravilhoso de Brasília…
Tive a oportunidade de conviver com crianças vindas de todas as partes e de todas as classes sociais, do Brasil e do mundo, que também vieram com suas famílias viver essa grande aventura! Espontaneamente, desenvolvi um olhar onde via a todos como conterrâneos e aprendi a admirar essa diversidade cultural. Entendi, desde cedo, que minha ancestralidade também fazia parte desse caldeirão de culturas.
Crescer em Brasília foi um privilégio, porque além do convívio com essa diversidade eu me via dentro dos desenhos e das formas únicas de sua arquitetura, criada pelo genial arquiteto brasileiro, Oscar Niemeyer. Um olhar moderno e contemporâneo a refletir e redimensionar o nosso cotidiano outrora interiorano e rural.

(Fotos minhas na construção de Brasília)

Crescer em Brasília foi um privilégio…

A nova Capital

Na época da construção de Brasília ficamos na “Cidade Livre”. Uma cidade/acampamento construída para receber os pioneiros que lá chegavam pra reconstruir suas vidas construindo a nova capital. Pessoas de todos lugares do Brasil e do mundo transitavam e trabalhavam freneticamente nas ruelas da “cidade” e nos canteiros das obras. Pra minha criança aquilo tudo era fascinante e o normal do viver. Não tinha a menor consciência do quão insólitos e históricos eram aqueles dias que vivíamos.
Em 1961, fomos morar na principal e, praticamente única, avenida da nova capital. Além de alguns pequenos prédios comerciais e casas geminadas, não havia muito mais na longa avenida W3… só construções rodeadas pelo cerrado agreste e lindo. Enquanto esperava a cidade crescer, sem rádio e nem TV, desenhar era meu melhor passatempo e onde conseguia expressar aqueles momentos tão extraordinários. Crescer junto com Brasília foi de fato um momento único pra nossa geração pioneira. Se por um lado era um privilégio viver e conviver naquela cidade moderna, por outro lado, o golpe militar feriu profundamente as nossas esperanças, alegrias e liberdade. Resistimos doando a espontaneidade da nossa juventude “vigiada”.
Comecei a pintar muito cedo, colecionava fascículos dos “gênios da pintura” e adorava a caligrafia “pop” de Toulouse Lautrec. Mais tarde me formei em Comunicação Visual pela UnB (Universidade de Brasília). Lá, frequentei todas as oficinas do curso da faculdade de desenho, para complementar minha especialidade em direção de arte e designer gráfico. Sócio do estúdio “Graphus” de criação, direção de arte, ilustração e publicidade. Uma referência em projetos visuais e também, por abrir as portas para a formação de estudantes de Comunicação, daquela época. O design gráfico e a pop arte era a visão que mais refletia o moderno e contemporâneo daqueles dias. Tempos em que buscar o novo era também uma forma de transgredir e resistir aos golpes conservadores. Tempos que se repetem agora no nosso “futuro”(!)

Viva México!!!

Em 1980, resolvi sair de Brasília. Queria expandir meus horizontes… quiçá, estudar pintura, história da arte e viver fora do ambiente publicitário. Essa minha escolha e o meu grande desejo de conhecer o México se juntaram e pra lá… eu fui!
Na Cidade do México, soube que havia um curso de mestrado em Artes Plásticas, na Escuela Nacional de Artes Plásticas San Carlos (ENAP) da Fundação UNAM (Universidad Nacional Autónoma de México). Como eu não tinha nenhum requisito formal pra me candidatar, improvisei um portfólio com as fotos dos meus quadros e marquei uma entrevista com a comissão de seleção para o mestrado de Artes. Para minha surpresa acabei conseguindo a vaga! Lembro de descer as escadas da Escola de Artes San Carlos, numa felicidade indescritível… afinal, era a mesma escada por onde passaram Frida Kahlo e Diego Rivera, entre outros tantos mestres mexicanos! Ali, minha vida mudou e tive a chance de viver momentos e experiências artísticas inesquecíveis! Além das oficinas de arte, estudar história da arte a partir de um contexto latino-americano, foi fundamental para descolonizar meu olhar. A cidade do México era uma ponte que unia todas as comunidades latino-americanas, do México até o Chile, incluindo todo o Caribe. Essas vivências me aproximaram da riqueza e diversidade da nossa cultura e resgataram minha “consciência latina”. Me apoderei do meu sangue latino de todas as cores, sabores e ritmos. E até hoje, questiono essa nossa “distância” cultural com a América latino-americana, da qual o Brasil também faz parte. Ainda que presente na nossa história e no nosso cotidiano, somos coagidos pelas mídias a manter o nosso “olhar” colonizado, voltado apenas para a “matriz” européia.

Escola de Artes San Carlos (UNAM) 2

Academia de San Carlos – Fundación UNAM

“Apoderei do meu sangue latino de todas as cores, sabores e ritmos.”

Cartaz para a apresentação da Orquestra Sinfônica Nacional de Cuba na cidade de México 1984. Parceria com “Cubartista

Cartaz para a apresentação da Orquestra Sinfônica Nacional de Cuba na cidade de México 1984. Parceria com “Cubartista

“Vaca Profana” 1985

De Volta ao País "Tropical"...

No México, tive a experiência de viver da minha arte expondo em galerias e participando de projetos cenográficos e direção de arte
na produção de shows musicais independentes. No entanto, em 1985, voltei ao Brasil para viver no Rio de Janeiro, respirando a volta do regime democrático brasileiro, pelo qual a minha geração tanto ansiava. No Rio, minha vivência mais marcante com a pintura, foi o curso de reflexão e prática de desenho e pintura com o artista plástico, Charles Watson na escola de artes visuais do Parque Lage entre 1991 a 1993.

Foi uma grande oportunidade, pra me livrar das métricas publicitárias e voltar a pintar com mais liberdade de expressão.
Ainda no Rio, entendi que umas das experiências mais ricas da arte contemporânea brasileira são os desfiles anuais das Escolas de Samba!
Até hoje me emociono ao ver esse espetáculo único que abarca todas expressões artísticas. Tem pesquisa, tem história, tem conceito, crítica social e política, enredo, música, dança, performances, artes plásticas, moda, figurino, tecnologia e representatividade. E é tudo!

Série “Cactus Bar” 1995

Uma Vila Charmosa aberta pro mundo!

Apesar de ter me reencontrado como artista, mais uma vez veio aquela vontade de buscar um lugar mais tranquilo pra viver e realizar meu trabalho.

Decidi vir pra Trancoso, na Bahia, pois tanto no México como no Rio, minha fonte de inspiração eram as culturas e mitologias africanas e indígenas.

Série “Baianas no Quadrado” 2012

Ateliê Urubu-Rei

Em 1996, já em Trancoso, finalmente pude me dedicar à pintura e ao papel-machê. Nesses 23 anos trabalhando com papel machê, desenvolvi uma técnica única, tanto na confecção, como nos acabamentos. Criei e produzi milhares de peças, inspiradas no artesanato afro nordestino e indígena, para clientes de São Paulo, Rio, Brasília, Goiânia, Belo Horizonte, Salvador, Miami, New York, Paris, Londres, Lisboa, Madrid, Milão, Atenas, Hong-Kong e Dubai.

Baianas e  peças inspiradas no Artesanato afro nordestino e indígena

Minha Pintura

As minhas variações e inspirações vêm da arte-pop contemporânea, da diversidade e representatividade nos cenários artísticos das artes plásticas, música, cinema, teatro, além das culturas e mitologias afro-brasileiras com uma pegada afro-futurista, pois percebo que tão importante quanto resgatar a história dos povos africanos, é vê-la inserida num “novo futuro” que construímos agora. Tanto na minha formação acadêmica como profissional trago vivências e pesquisas com o desenho gráfico afro-brasileiro, indígena e a pop arte, no seu humor irônico e caricato. Já as cores e estampas, refletem minha paixão pela Bahia e por Trancoso, com sua intensa luminosidade e natureza exuberante. Cores fortes e únicas! Trabalho com base acrílica e crio as cores com pigmentos e resina, trazendo uma paleta exclusiva para cada tela.

“Amo cores, tintas e pincéis!

Adoro uma tela branca!

Amo pintar e preciso pintar, pra me sentir bem.”

Novos Tempos ...

Os tempos mudam e nessas mudanças eu vou me transformando… Desde que cheguei aqui, em Trancoso, meu trabalho cresceu e se desenvolveu dentro do ambiente social e geográfico desta vila charmosa, que atraia pessoas e tribos de todo o Brasil e do mundo. Ele fluía e era muito procurado, atendendo ao mercado de arte local, totalmente informal, e aos colecionadores que aqui chegavam curiosos para conhecer os artistas locais e seus trabalhos.
Entretanto, a pandemia nos abateu e transformou todo o cenário local. Há três anos nós, os artistas, tivemos que entender este processo, sair da nossa zona de conforto e aprender a expor nossos trabalhos num sistema de mercado da arte mais amplo, competitivo e formal, tanto presencialmente como através das plataformas e redes sociais. Apesar de ser um processo que requer tempo, pesquisa e estudos com muita dedicação, estou me redescobrindo ao reconfigurar o meu cenário de atuação como artista plástico inserido no mercado de arte nacional.

Por Fim...

Falando sobre arte, conceitos e inspirações, sinto que o artista na realidade sempre representa suas variações e conexões com seu universo próprio e suas interações sociais. Nossa expressão é a forma que damos aos nossos sentimentos, impressões, vivências… à nossa própria história. Nus e abertos, mostrando nossas feridas, humores, paixões, desejos e contradições.
Quando trabalho pintando, não penso em nada, nem mesmo na arte, apenas sinto o poder das formas, a força das cores e a angústia apaixonada de me recriar continuamente. E percebo que só dou por terminado um trabalho, quando é criada uma conexão com quem o observa. Nesse momento, ele ganha potência e passa a ser uma produção artística.

Portanto, é com sinceridade que agradeço ao seu olhar!

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